Pólo da Indústria Naval de Jaconé deve sair do papel com investimentos iniciais de US$ 400 milhões
Pré-sal pode ter porto em Jaconé e Transpetro está estudando o local
A Transpetro está estudando construir um terminal de líquidos em Maricá para receber o petróleo do pré-sal. Por possuir um grande calado, o local onde será o Porto de Jaconé é um dos três lugares do estado que possibilitam a instalação desse empreendimento. A informação foi dada, pelo gerente de Desenvolvimento de Logística para o Pré-sal da empresa, Paulo Penchiná, durante a Niterói Naval Offshore (NNO), no Teatro Popular, que terminou na quinta-feira (10).
De acordo com Penchiná, um terminal precisa ser construído em área que possibilite a atracação de grandes navios petroleiros. O porto de Itaguaí e a ampliação do Terminal de Líquidos da Ilha Grande, em Angra dos Reis, são as duas outras possibilidades que estão sendo analisadas pela subsidiária da Petrobras para atender a demanda do pré-sal.
“O porto que foi anunciado pela Prefeitura de Maricá para Jaconé será construído para atender diversos segmentos. Mas o local possui a vantagem de ter um excelente calado e isso nos atraiu. Estamos estudando três possibilidades para a implantação de um terminal de líquidos, porém, a princípio, uma não inviabiliza a outra”, explicou.
O executivo da Transpetro estima que esse estudo será concluído ainda no primeiro semestre do ano que vem. Penchiná ressaltou que tanto Maricá, quanto Itaguaí e Angra possuem logísticas ideais para atender o Comperj. Ele destacou que além de atender o complexo petroquímico de Itaboraí, o novo terminal atenderá as demandas de exportação e das refinarias de Duque de Caxias e de Belo Horizonte, em Minas Gerais.
No painel sobre as oportunidades do pós e do pré-sal, os conferencistas foram unânimes em afirmar a necessidade de investir no conteúdo local de toda a cadeia produtiva naval e offshor
“O excesso de impostos dificulta a competitividade da indústria nacional. As oportunidades estão aí. O desafio é aproveitá-las no Brasil”, diz Alberto Machado, da Abimaq.
CRÍTICAS AO PÓLO NAVAL
Grandes construtoras ameaçam degradar boa parte da riqueza socioambiental de Jaconé com a construção de um gigantesco pólo naval. As mesmas estão sendo atraídas para Maricá, entre outras razões, devido a um suposto menor rigor no licenciamento ambiental fluminense em relação ao baiano.
Como se já não bastassem as tentativas de ocupação da Área de Proteção Ambiental (APA) de Maricá com um mega-empreendimento imobiliário, o superaquecimento da especulação imobiliária neste município pressionando suas áreas preservadas – devido, sobretudo, à instalação do Complexo Petroquímico de Itaboraí (Comperj) no município vizinho - e os iminentes impactos deste complexo em águas maricaenses, surge mais uma potencial e poderosa agressão ambiental: a construção do Pólo Naval, em Jaconé.
Riqueza socioambiental X interesses econômicos
Local de grande importância pré-histórica, histórica, ambiental, social e cultural, Jaconé é um distrito que se divide entre Maricá e Saquarema, municípios da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, cujas vocações econômicas eram eminentemente rurais e turísticas, pelo menos até bem pouco tempo. A área onde será construído o pólo está situada dentro dos limites de Maricá.
A idéia dos empresários, industriais e políticos envolvidos no projeto é transformar uma área de aproximadamente cinco milhões de m² num gigantesco pólo naval, a ser erguido nos próximos anos segundo a imprensa. Assim, com esta obra, já é considerada certa a destruição de ecossistemas de restinga e de parte da bela Praia de Jaconé, além da descaracterização da paisagem de pontão rochoso contíguo ao local e também a poluição e a alteração de águas marinhas fundamentais à manutenção da biodiversidade, da pesca e do turismo.
Baianos arretados, fluminenses prejudicados
O curioso nessa história, é que justamente um dos motivos para a implantação do pólo em Maricá está num suposto menor rigor do licenciamento ambiental do governo do Estado. Pelo menos é isso o que dá a entender o secretário municipal de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Petróleo, Aleksander Santos, em sua afirmação de que "Problemas na concessão de licenças ambientais na Bahia poderão beneficiar o estaleiro que será instalado em Jaconé” .
Os problemas a que se refere Santos dizem respeito às dificuldades na liberação de licenças ambientais de outro pólo naval, no Recôncavo Baiano, do Consórcio Setal/OAS. Este consórcio teria, assim, demonstrado interesse em trazer o complexo para Maricá, numa alusão de que aqui as coisas poderiam ser ambientalmente mais “fáceis”.
Faraônicas, autofágicas e anacrônicas
Além do estaleiro, segundo notícias [4], o empreendimento também terá um porto, empresas de logística offshore e de construção naval. O investimento total é estimado em R$ 1 bilhão e já há articulação política para a busca de incentivos fiscais. Há ainda a previsão de construção de uma ferrovia ligando o porto de Maricá a Itaboraí para escoamento do minério de ferro para o Comperj e a implantação de um pólo tecnológico aeronáutico não muito distante do pólo naval .
Não foram encontradas referências quanto à mitigação ou compensação dos impactos socioambientais que serão ocasionados com tais obras faraônicas e suas operações. Mas, nunca é demais lembrar que, por mais competentes que venham a ser estas iniciativas obrigatórias, elas jamais substituirão ou compensarão adequadamente o que será degradado ou perdido em termos de riqueza ecológica, integridade da paisagem natural, serviços ambientais e modo de vida dos moradores.
Trocando em miúdos, dirigentes empresariais e políticos parecem querer transformar Maricá num ícone do desenvolvimento econômico autofágico e antiecológico. Ou seja, por um lado receber megainvestimentos, crescer extraordinariamente e criar milhares de empregos, mas, por outro, negligenciar o respeito e a proteção às comunidades locais e aos ecossistemas remanescentes - incluindo seus sistemas de manutenção da vida e da qualidade de vida humanas.
Tudo isso por conta da continuidade de uma tríade ainda paradigmática e hegemônica no atual modelo de desenvolvimento: (1) falta de visão de longo prazo, (2) concepção ultrapassada de "progresso" baseada na doutrina do desenvolvimentismo e (3) priorização do uso (e abuso) dos combustíveis fósseis em detrimento de outras matrizes energéticas mais limpas. Mas, o mais grave, é que esse direcionamento anacrônico se fortalece em plena era do despertar da humanidade para os desafios globais das mudanças climáticas e de outros graves e urgentes problemas socioambientais (vide o populismo em torno do pré-sal).
A questão é: será que a sociedade, terá a coragem, o tempo e a força suficientes para se posicionar e tentar recusar mais esse presente de grego? Talvez as futuras gerações, mais do que ninguém, esperam que a resposta seja um sonoro sim...
* Coordenador do grupo Ecoando - Ecologia & Caminhadas, guia ecológico, mestre em Ciência Ambiental (PGCA-UFF), Planejador Ambiental (PGPA-UFF) e membro do Conselho Consultivo do Parque Estadual da Serra da Tiririca.